Crônica de Ligia Prieto

 

Imagem Mel Rocha

Sabe, ninguém é perfeito. Exigir que o outro seja como a gente quer que seja, causa um cansaço incomensurável na alma. Querer, obrigar, esperar que o outro cumpra nossas expectativas frustradas de existência, não melhora nossa vida em nada. A escuta do mundo não está no que eu quero de você e sim no que você é. Composta de tudo aquilo que traça sua historicidade. Queria eu querer pelo outro. Há duras penas entendi que não posso. Me entendi estação. Dou tudo aquilo que não tenho, porque se desse o que eu tenho, seria caridade, e não gosto dessa palavra, sigo tendo pouco e dando aquilo que me faz falta, espalho pedacinhos de alma minha por aí sabendo que às vezes ela não vai voltar, que diante da minha dor, talvez você não esteja lá, mesmo eu tendo estado lá na sua, e assim vice-versa também, que não sou santa e nem onipresente da dor alheia. Queria querer por você e dizer que o mundo é vasto, lotado de sabores diversos, de possibilidade doidas, e que tá aí, meio capenga, mas ainda de pé, pra quem tem fome, quem tem fome é que tá sem conseguir ficar de pé. Mas pra quem não tem fome não adianta dar um prato de comida. Com tanta fome no mundo, não deveríamos alimentar as pessoas erradas. Um dia eu li que ensinar é "tirar de dentro do outro o melhor que esse outro tem". Que desafio. Há 21 anos trabalho com arte, há 18 anos dou aula. Comecei cedo, com pequenas oficinas em encontros religiosos, na escola, etc... Sem nunca parar de estudar, de organizar minha relação com o mundo, em todo caminho na psicanálise e no teatro construído nesses anos. E a estrada parece não ter fim. Eu tô no começo ainda, mas preciso de urgência, que a Sapucaí é longa e a vida é curta pra tanto desejo. A escuta é aquilo de mais doce e amargo que carrego, às vezes tenho vontade de calar o mundo, e impotente, me calo.


Ligia Prieto


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